Eu lembrei deles por anos, sempre que tinha vontade de sair com as amigas, mas tinha que ficar em casa cuidando do meu filho. Abdicações maternas… E pensava “não posso voar hoje, tô fazendo meu mel”. E olhava ele ali, dormindo, esquecia as amigas e, resignada, dormia também.
.
A abelha da canção… ela sabe do que precisa pra sobreviver e da urgência daquele exato momento; ela não pode dividir aquele tempo com outras coisas. É o tempo do cuidado. Não pode ser depois.
.
Isso foi recorrente por mais de uma década. A abelha tava sempre fazendo o mel. Correndo o dia todo de um lado para o outro entre as atividades terapêuticas, a natação, a fono, a escola, e também o expediente formal de trabalho, ao qual muitas vezes precisava faltar. Nesse ritmo acelerado do fazer o mel, muitas perdas de oportunidades profissionais, de vida social e amorosa, de saúde, de beleza e de vigor.
.
Ontem, conversando com outras mães atípicas durante um evento, também vi nelas essa “abelha que não voou pra fazer o mel” e então me perguntei, mais uma vez, o quanto essa abdicação compulsória geralmente recai sobre a mulher nessa sociedade patriarcal, mesmo que o pai seja presente.
.
E eu pergunto: no caso das mães atípicas, realmente vale “o tempo que não voou?”
.
Vale sim! Vale muito! Porque quando a gente olha para os nossos filhos, a gente vê que tudo é menor.
.
Mas cá pra nós, sem romantizar a maternidade: podia ser diferente…
.
Se não fosse a força patriarcal que coloca a mulher no centro dos esforços da casa e dos filhos, a maternidade atípica não precisava ser assim, sinônimo de exaustão extrema. Ao contrário, teria como base o famoso provérbio africano que diz que “é preciso uma aldeia inteira para criar um filho”.
.
E todos poderiam voar, fazendo valer também para a abelha outros versos da mesma canção: “(…) Todo dia é de viver para ser o que for e ser tudo”.